Quem segue Victoria De Angelis, a competentíssima baixista do Måneskin, sabe que ela é uma exibicionista profissional dentro e fora dos palcos. Do alto de seus 23 anos de idade, a loira com ascendência dinamarquesa coleciona fotos provocativas e sensuais em suas redes sociais.

Há quem vá levantar o debate da objetificação. Eu, do alto dos meus 42, acho uma conquista do feminismo. Mostra quem quer, quem se sente à vontade, e não é da conta de ninguém qualquer senão sobre. É libertário e transgressor estar de bem consigo. É amor próprio. É confiança. Em 2023, o corpo feminino sequer deveria ser tabu ou tema de discussão.

Quando eu, quase 20h de uma quinta-feira, me sinto obrigada a sentar e escrever sobre, é porque a cada dez passos para frente, a gente precisa voltar algumas casas e ser didática sobre a posição da mulher na sociedade. Sabe o ditado “lugar da mulher é onde ela quiser”? Isso vale para o seu comportamento. Desde que não infrinja leis, ética (principalmente entre mulheres), temos mais do que o direito, temos o dever de sermos livres.

Mais do que a excelente profissional que é, Victoria De Angelis é uma personagem importante fora do contexto Måneskin. Ou melhor, todo o Måneskin e sua postura infratora da política moral e dos bons costumes é necessário. Como única mulher, Victoria vai além. Tem uma geração se espelhando nessa infinita vontade de viver. De ser. De não se importar a opinião castradora do outro.

Não estamos falando de crimes. De preconceitos. De aberrações. Estamos falando de liberdade de ação e expressão. Na guerra dos valores da Itália dominada pela extrema-direita, a única arma que ela usa é o próprio corpo. Não é, nunca foi, e jamais será criminosa a honraria de mostrar – e sentir-se confortável com isso – o que é seu.

Há as contrapartidas, é claro. Não deveria, mas estão à mesa. E o julgamento sempre condena a mulher. É mais fácil dizer que ela se expôs porque quis, estava ciente da prestação a ser paga, do que condenar o comentário libidinoso – e asqueroso – do cantor Vasco Rossi, 71 anos de idade e uma carreira de tantos sucessos e prêmios, que poderia passar sem a mancha do machismo que tem “estrutural” no sobrenome, mas que a essas alturas já pode ser considerado escolha. E, diante do contexto, falta de bom senso.

No Instagram de Dagocafonal, o veterano se sentiu à vontade para comentar publicamente uma imagem de Victoria trajando um biquini com “Slurp”, onomatopeia para quem, em bom português, lambeu os beiços. Não contente, ainda mandou um emoji de foguinho. Tudo isso publicamente. No fim, quem vai para o tribunal popular é ela mesmo. Os homens são apenas reação aos maus hábitos das mulheres contemporâneas, eles dizem. Se defendem em um corporativismo que poucas vezes encontra resistência.

No caso, algumas arrobas masculinas realçaram o fato de Victoria ter idade para ser sua neta e que, portanto, o comentário caiu mal. Foram poucas, mas apareceram. A maior parte foi lá e ainda curtiu a malícia blindada dos homens de bem.

Vasco Rossi, como dito acima, é um artista alabado. Tem feats com os principais nomes da música italiana. É ídolo de muitos, inclusive. Difícil imaginar que alguém tomará partido dela e deixará de convidá-lo para qualquer música, show ou evento. Ou que dará aquele conselho de amigo de que isso não se faz. Ou lhe dará uma aula de feminismo, liberdade e mulher contemporânea. Vai passar batido.

E, mais uma vez sendo didática, é de suma importância ressaltar que, embora livre, transgressora e “exposta”, Victoria não precisa se deparar com velhos babões. Chegamos a um momento tão importante da nossa história feminina que sequer um “linda”, apenas elogioso, cairia bem. Contemplem, se quiserem, mas o façam em um respeitoso silêncio.

O silêncio de quem, enfim, foi capaz de entender que não importa a quantidade de roupa, não importa aquilo que fala, não importam os gestos, mulher não é patrimônio público. A nós, graças às muitas Victorias da História, foi dado o direito de viver como… um homem. Ou alguém da espécie já foi incomodado por andar sem camisa na rua, em um exemplo quase simplório do que é dado e do que é tolhido socialmente?

Se esforçam diariamente para nos provar o contrário, mas é isso. Hoje, somos livres. Não somos objeto.

Sim, a última frase é quase um apelo lúdico. Somos, mas ainda não deixam que sejamos. Mas seremos, um dia, totalmente sem mordaças sociais como a senhorita De Angelis.

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