Quatro dias e um feriado depois, olhar a lista de vencedores do Grammy Latino 2024 já com a devida distância emocional só aumenta a indignação com os resultados da 25ª edição do evento mais importante para a música latina. Não é, obviamente, uma crítica direta ao grande nome da noite, Juan Luis Guerra, mas uma reflexão sobre onde estavam os votantes durante o último ano? Nárnia, talvez? Ou em algum planeta em que o tempo não passa, uma opção mais plausível.

Porque, certamente, o destino dos gramofones distribuídos na última quinta-feira (14) fariam sentido há 25 anos. Não em 2024.

Há muito tempo, o LatinPop Brasil utiliza esse espaço para falar sobre o tal “clubinho” do Grammy Latino. Aquele grupo de artistas, que por lobby ou preferência pessoal, vai saber, sempre estará presente entre os indicados e, mais ainda, terminará o evento sempre premiado. Além do veterano Rei da Bachata, as vitórias de nomes como Jorge Drexler e Luis Fonsi foram a prova cabal de que se cantarem “parabéns pra você”, eles serão triunfadores.

E, veja bem, Derrumbe, o tema vencedor do uruguaio, deveria ficar isento de críticas, já que é um ótimo tema, mas passou longe de ser a Música do Ano. A categoria, diga-se de passagem, já estava capenga desde a indicação, mas Te Lo Agradezco, a parceria entre Kany García e Carín León seria o destino justo do prêmio. No ano em que a “ranchera” chegou ao mundo pop, León poderia ter vencido também ao lado de Maluma com Segun Quién.

A mais injusta das vitórias, sem lugar para dúvidas, foi a de Luis Fonsi na categoria Álbum do Vocal Pop Ano com El Viaje. Não foi sequer o melhor álbum da carreira do porto-riquenho, imagine em uma competição com Orquídeas (Kali Uchis), .mp3 (Emilia) ou García (Kany García)? Ninguém entendeu.

A Academia Latina de Gravação esteve tão perdida em 2024 que não dá para entender se olhou para o futuro, passado ou presente. Não teve lógica ou coesão. Os dois artistas mais indicados da noite, Karol G e Bad Bunny, só não saíram de mãos abanando porque levaram um troféu para casa. E Mañana Será Bonito merecia mais do que ficar relegado a uma categoria “urbana”.

E se o assunto é álbum, a maior injustiçada foi Mon Laferte. Autopoiética levou entre os “alternativos”, mas merecia o principal. Perdeu para Guerra e um EP de seis músicas, Radio Güiira, algo que nem o poderoso currículo do dominicano é capaz de explicar.

E se antigamente pareciam parte do tal clubinho, Residente e Shakira passaram praticamente despercebidos em categorias menores. Foi confuso, muito confuso.

Mais do que entregarem bons trabalhos ao mercado, os artistas latinos aprenderam que precisam fazer o networking perfeito para alcançarem o sucesso entre os acadêmicos. Amizades valem mais do que talento. Relacionamento é mais importante do que conceito.

Não fosse assim, artistas do porte de Manuel Carrasco ou Ha*Ash não seriam solenemente ignorados ano após ano (sim, o espanhol até recebeu uma indicação em 2023, mas um feito muito aquém daquilo que entrega em seus discos há duas décadas). As irmãs Hanna e Ashley teceram duras críticas à Academia no passado e disseram terem desistido do Grammy Latino. O clássico Perdón, Perdón não foi premiado, dá para acreditar?

Thalia é outra que parece ser persona non grata no clubinho. A saber se por conta do seu relacionamento com Tommy Mottola e todo o imbróglio P. Diddy, ou por pura implicância. Bebé, Perdón tinha espaço fácil na lista de indicados de 2024.

É possível contar nos dedos os acertos desta edição do Grammy Latino. Uma delas foi o prêmio de Artista Revelação para Ela Taubert, vencendo o “stream” de Iñigo Quintero. As vitórias de Nathy Peluso também. E, por falar em argentinas, a ausência de Tini, que entregou seu melhor álbum neste ano (Un Mechón de Pelo), já era um indicativo de que algo muito errado está nas entranhas daquela que deveria ser “a noite da música latina”.

É, sim, a noite de um júri retrógrado, incapaz e alheio ao mercado contemporâneo. Mais uma vez, o Grammy Latino conseguiu deixar todo mundo insatisfeito.

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