Em uma edição sem favoritos, a única certeza que ronda o Eurovision Song Contest é que Israel deveria ter sido banido pela União Europeia de Radiofusão (EBU) em 2024. A presença do país após a invasão de Gaza e os diversos bombardeios na Palestina vem gerando desconforto entre os fãs e artistas do festival.

Eden Golan, de 20 anos, foi selecionada para representar os israelenses e sua primeira proposta, October Rain, foi recusada pela entidade por duas vezes. A música fazia clara menção aos ataques do Hamas, incluindo um verso que dizia “Todos eram boas crianças, cada um deles”. Após o segundo veto, o país decidiu levar Hurricane, mas não aplacou a tensão que paira sobre o evento em Malmö, na Suécia, entre os dias 7 e 11 de maio.

Até outubro, os suecos preparavam uma grande festa para celebrar os 50 anos da icônica vitória de Waterloo, do Abba. O jubileu, contudo, virou assunto secundário. Se a Rússia foi considerada “persona non grata” depois da guerra contra a Ucrânia, por que a EBU tem sido tão condescendente com Israel?

“Esta edição do Eurovision será a mais politicamente carregada da história por conta da guerra em Gaza e da situação humanitária ali”, disse Magnus Ranstorp, especialista em terrorismo da Universidade Sueca de Defesa, em Estocolmo, em entrevista ao The Guardian.

Com uma população multicultural, Malmö tem forte presença de palestinos. O cenário é de completa insegurança a menos de um mês do festival, já marcado por dezenas de protestos. “Para ativistas e extremistas, será uma oportunidade de ouro para perturbar o evento”, completou Ranstorp. A polícia local se prepara, inclusive, para invasões de palco e teme pela segurança do público e dos artistas.

No mês passado, centenas de artistas e organizações no Reino Unido apelaram a Olly Alexander, o participante local, para desistir do concurso. Alexander, juntamente com vários outros concorrentes, rejeitou o apelo e disse que iriam “usar a nossa plataforma para se unirem e apelarem à paz”.

Martin Österdahl, supervisor executivo da EBU, garante que Israel não recebeu tratamento especial. “Eu e minha equipe analisamos cada etapa e, em muitos casos, os membros nos contactam com antecedência para uma pré-consulta se não estão certos sobre sua música. Durante aquela fase, o membro israelense falou conosco quando tinham duas músicas finais. Nós olhamos para eles e dissemos: ‘Desculpe, não achamos que isso será aprovado, então você terá que remediar por meio de modificação ou reenvio.’ No final, diz ele, eles enviaram oficialmente a música ‘modificada’ Hurricane”.

Österdahl se recusou a responder sobre o que os organizadores farão se a multidão vaiar Israel ao vivo ou um artista fizer uma declaração no palco, dizendo que apelarão aos participantes para “se concentrarem no que nos une, não no que nos divide”. “Eurovision não é plataforma para resolver conflitos globais”, disse o mesmo executivo que suspendeu a competição em 2020, em razão da pandemia de Covid-19 e baniu a Rússia há dois anos. Segundo ele, as situações são diferentes e o festival “não trabalha para governos (…) entendemos que estejam preocupados, mas esse é um evento de música”.

Crise humanitária e genocídio

Em seis meses, a invasão à Palestina matou, pelo menos, 32.623 pessoas. Mais de 75.092 ficaram feridas, de acordo com o Escritório das Nações Unidas para a Coordenação de Assuntos Humanitários (OCHA, na sigla em inglês).

Segundo a ONU, 85% da população no setor sitiado — onde vivem mais de 2,3 milhões de pessoas — foi forçada a evacuar as suas casas devido à atual situação na Faixa de Gaza, que inclui a destruição de infraestrutura e a falta de alimentos, água, combustível e eletricidade.

No mês passado, o relatório da Integrated Food Security Phase Classification (IPC) – uma respeitada rede internacional que fornece aos governos, à ONU e às agências de ajuda humanitária dados apolíticos para medir a escala da fome – alertou para uma fome iminente em Gaza.

“Prevê-se que metade da população da Faixa de Gaza (1,11 milhões de pessoas) enfrente condições catastróficas” no que diz respeito à segurança alimentar, afirmou. Israel afirma que a avaliação da ONU contém informações imprecisas e diz que as agências da ONU não conseguiram distribuir a ajuda que chega diariamente.

Resoluções apelando à maior assistência humanitária ou proteção aos civis — como a apresentada à Assembleia Geral da ONU, em outubro, e outra ao Conselho de Segurança, em dezembro — foram aprovadas, mas até o momento não surtiram efeitos significativos na crise humanitária.

Israel, inclusive, tem ignorado a última resolução aprovada no fim de março pelo conselho, que exige um cessar-fogo imediato. Só nesta semana, um ataque israelense contra um comboio da ONG World Central Kitchen (WCK), que distribui cerca de 350 mil refeições diariamente, deixou sete trabalhadores humanitários mortos. Segundo o Ocha, em publicação na sexta-feira, pelo menos 225 agentes morreram desde o início do conflito. “Também [não estão sendo respeitados] direitos como o acesso à ajuda em situações como essa. É contra o direito humanitário internacional impedir a entrada de ajuda em Gaza” afirmou Emily Wight, porta-voz da Save The Children, ao jornal O Globo.

Não é razoável que Israel esteja no Eurovision

Participante do ESC desde 1973 e com quatro títulos no currículo, Israel afronta os direitos internacionais ao impor sua presença neste cenário. Não há ginástica mental que justifique a decisão da EBU, sua hipocrisia e permissividade. Não existe uma forma moral ou ética de assistir ao festival neste ano.

Apesar de ter em sua cartilha que não se trata de um evento político, o Eurovision ignora questões básicas de humanidade. E de forma tendenciosa e irresponsável, deixa o público à revelia, constrange os artistas a subirem em um palco maculado e abre brecha para um fracasso histórico em diversos aspectos, inclusive o de audiência.

Com um repertório fraquíssimo também no quesito musical, o boicote seria bandeira e uma saída pela tangente. Uma maneira digna de dizer “até 2025”!

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