Esta análise demorou a sair por uma razão simples: no último sábado, 18 de novembro, eu estava com a minha filha de 14 anos no Engenhão para o segundo show da The Eras Tour no Brasil. Na noite anterior, Ana Benevides, de 23 anos, morreu no estádio sob uma sensação térmica de 62 graus.
Nosso show foi adiado poucos minutos antes do ato de abertura feito por Sabrina Carpenter. Horas depois da nossa espera em um calor escaldante. A decisão correta na hora errada. Depois disso, enfrentamos um caos na saída do local, que não estava preparado para debandada de fãs naquele momento. Não pudemos ficar no Rio de Janeiro para a apresentação de segunda-feira, tampouco queríamos.
Soube da morte da Ana ainda na madrugada e tinha a absoluta certeza de que o show daquele sábado seria cancelado. Obviamente, pela manhã, antes do público chegar ao local do evento. As condições térmicas eram insalubres; o clima tenso, pesado, difícil para os fãs. E, não duvido, para a artista também.
Ao saber do ocorrido, Taylor Swift escreveu em seu Instagram que lamentava a morte de Ana e estava de coração partido. E, a partir daí, toda a organização cometeu uma série de equívocos na tentativa de se distanciar do ocorrido, ao que tudo indica, evitando a esfera criminal. A loirinha, como a norte-americana é carinhosamente chamada pelos fãs, manteve uma atitude blasé que, sinceramente, não condiz com a sua própria imagem na relação com os seguidores.
Não. A Taylor não tem culpa da tragédia. A T4F, organizadora da turnê, sim. O Governo do Estado do Rio de Janeiro e a prefeitura da cidade também poderiam ter evitado o caos ao, simplesmente, proibirem a realização de qualquer evento ao ar livre na cidade que fritava em condições climáticas extremas.
Mas a Taylor tem culpa, sim, na maneira fria com que tem conduzido os acontecimentos desde então. Gigante como é, tem mãos firmes para gerenciar a própria carreira e tomar atitudes à revelia dos contratos, tendo em vista que dinheiro não é exatamente um problema nesse caso.
E o que o RBD tem a ver com isso? Na mesma semana, o grupo da sua Soy Rebelde Tour a série de shows mais inesquecível no Brasil em 2023. Anahí, Dulce María, Maite Perroni, Christian Chávez e Christopher Uckermann, tão criticados por serem quarentões cantando músicas de 20 anos atrás, deram um show de simpatia e sinergia com os fãs. Mais do que isso, eles conhecem a tragédia de perto. Mas lidaram com o caso de maneira totalmente distinta, com empatia, prestando assistência e, principalmente, dando as caras para enfrentar o momento.
Três pessoas morreram e ao menos 42 ficaram feridas, algumas em estado grave, em tumulto ontem durante apresentação e sessão de autógrafos do grupo musical em 2006. Até hoje, eles citam o evento como o pior momento de suas carreiras. Ao deixar o Brasil, agora em 2023, Dulce María lamentou a morte da fã de Taylor Swift: É algo terrível. Não tenho palavras [para expressar]. Nós [RBD] passamos por isso e é a coisa mais horrível que pode acontecer com você. Mas, graças a Deus, pela experiência que tivemos, cuidamos da segurança para que não se repetisse. Mas é lamentável” declarou.
O gerenciamento de crise da Taylor Swift e da T4F é de centavos. A produtora só se manifestou ontem sobre o ocorrido, em um pronunciamento, para dizer o mínimo, vergonhoso. Só faltou um “desculpe a quem se sentiu ofendido”.
Vídeo em rede social quando o traslado do corpo precisou ser pago por fãs – nem a equipe da Taylor, nem a empresa prestaram socorro – é desumano. Falar agora que vai garantir o mínimo – acesso a água e segurança – é fazer fã, que paga caro, de trouxe. E não traz a vida de ninguém de volta.
Assim que a morte de Ana Clara Benevides começou a ser noticiada, representantes da T4F e da equipe da Taylor Swift deveriam ter acompanhado todo o processo, dando assistência, inclusive, à amiga que estava com ela. Não houve contato que não fosse via Internet. Não se fala no assunto porque a artista está abalada e tem evitado homenagens no palco. Parece que foi um incidente corriqueiro, não a perda da vida de uma filha, irmã, amiga de alguém.
Colocar o seu próprio sentimento diante de uma tragédia é se colocar em um pedestal que não cabe a ser humano nenhum. Estamos falando de adultos responsáveis por seus próprios atos e consequências deles. Como fãs e consumidores, é nosso dever fazer críticas e cobrar de quem é devido por cada uma das atitudes falhas. A gente paga caro pelos shows, não paga?
Taylor Swift é uma artista maiúscula e nunca vai deixar de ser o principal nome feminino da música de sua geração, isso não vai mudar. Assim como a atitude pequena de sua equipe, gestores. Sobre a T4F, apenas uma constatação de quem esteve no local no dia seguinte: colocar tapumes para fechar o estádio e placas de alumínio no chão fizeram do estádio uma fritadeira, é inacreditável que ninguém tenha percebido isso. Eu não acredito.